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«O Desafio para a Implantação da Fé Ortodoxa
na América Latina»

Pe. Gorazd, hieromonge
Tradução de Pe. André, hieromonge

muito comum observar um certo desconforto e, até mesmo, uma certa insipidez entre alguns sacerdotes ortodoxos quanto a fazer da “Ortodoxia” algo compreensível para a nossa gente, para o nosso povo e, é precisamente ali, a meu entender, onde reside a causa do problema.

Muitas vezes nós, ortodoxos, pecamos por nos empenharmos em pregar mais a ortodoxia do que o próprio Cristo vivo, morto e ressuscitado, que se elevou da Cruz como Senhor do Universo e da História. É Ele quem fundamenta a doutrina da Igreja e não o inverso. Lamentavelmente, muitos de nós, mais do que pregar Cristo, tendemos antes a pregar na realidade nossos costumes religiosos étnicos, culturais, a riqueza de nossa arte sacra, a solenidade soberba de nossos coros entoando os Oito Tons da liturgia, relegando quase a um segundo plano a pregação do Evangelho.

É preciso reconhecer que existem duas dificuldades básicas para o desenvolvimento da Igreja Ortodoxa na América Latina: primeira, é que a grande maioria do clero, sacerdotes e, sobretudo bispos, é de estrangeiros; e, segunda, é que há um certo “enviesamento” em nossas ações pastorais.

É uma prática bastante comum na formação de algumas missões ortodoxas o esforço em atrair fiéis pela beleza dos ícones, pela solenidade de nossos ritos. A beleza da tradição bizantina greco-eslava sobressai majestosamente para aqueles que atravessam as portas de nossos templos. Não obstante, isso não é suficiente. Não devemos nos esquecer que ser ortodoxo é, antes de tudo, ser cristão e, um cristão centra sua vida na mensagem do Evangelho e na perenidade da Tradição da Igreja. Nota-se com freqüência que os nativos, convertidos à fé ortodoxa, insistem em usar um “dialeto babélico”, algumas palavras em grego ou em eslavo litúrgico ou, inclusive, se afanam em saber tal ou qual coisa em um determinado idioma que se identifica com sua igreja, como se disto dependesse sua qualidade de cristãos ou sua fidelidade a Cristo. Devo reconhecer que, geralmente, esta atitude desvia o convertido de seu objetivo espiritual e o centra em questões lingüísticas, artísticas, étnicas, nacionais ou culturais.

Percebe-se com freqüência em alguns clérigos certa tendência a “estrangeirizar” o convertido latino como se sua latinidade fosse um obstáculo ou uma inclinação cultural negativa a ser sanada para que se torne um autêntico cristão ortodoxo. Esta postura traz em si uma concepção míope do cristianismo, uma vez que a cultura não é impedimento para abraçar a fé cristã, negando de fato, com tal atitude, a universalidade da Boa Nova.

Objetivamente, quem exerce função pastoral na América Latina não encontrará um panorama como o que se pode encontrar na Ásia central ou África ocidental, posto que, os povos latino-americanos possuem já cinco séculos de tradição cristã. Como sacerdote, há que se ter bem clara esta situação e não se pode atuar depreciativamente sobre o sentir religioso dos povos para os quais se exerce o ministério. Muitas vezes, a missão de um sacerdote ortodoxo nessas terras não é precisamente fazer conhecer a Cristo, mas aperfeiçoar o conhecimento que já se tem d'Ele.

Uma das questões que precisa ser posta com maior insistência é o tema do rito. Considero que o rito de São João Crisóstomo não pode ser obstáculo para a celebração dos ofícios litúrgicos, assim como, evidentemente, não foi o rito romano para a Igreja Católica na evangelização da América Latina. Muitos detratores do rito latino sustentam que tal rito é absolutamente alheio à cultura dos povos latino-americanos, não obstante, o que teriam em comum um camponês indígena do século XVII com um comerciante veneziano, ou com um artesão bávaro? Isto porém, não impedia que num ou noutro lado do mundo expressassem a fé de modo comum, celebrando os santos Mistérios num mesmo e único rito.

A pluralidade dos ritos é uma manifestação da riqueza da Igreja e da universalidade da mensagem cristã. Por tal motivo, é louvável o trabalho que levam a cabo algumas igrejas ortodoxas no sentido de promover uma evangelização mais ampla, apoiadas em algum rito ocidental, tal como o Patriarcado Antioqueno nos Estados Unidos, a Igreja Russa no Exílio, principalmente na Austrália [...] No caso do Patriarcado Antioqueno, o rito escolhido é o tão conhecido rito tridentino ao qual se agregou certas variantes, como a inclusão da Epíclese; no caso da Igreja Russa no Exílio, optou-se, em países de língua inglesa, pelo rito “Old Sarum”; e, na Igreja Ortodoxa de França o rito galicano, com notáveis influências bizantinas e visigóticas.

Voltando ao tema que nos ocupa, pessoalmente, creio que o rito bizantino é o mais indicado, posto que, sendo rito majoritário na Igreja Ortodoxa, torna possível uma maior integração litúrgico-espiritual entre as diversas jurisdições, criando uma maior consciência de pertença a uma mesma Igreja. Mesmo reconhecendo que a unidade na ortodoxia se dá pela fé, sendo o rito sua expressão visível, convém que também seja comum a fim de evitar desencontros que possam resultar tão inúteis quanto dolorosos.

O fato de celebrar no rito bizantino não significa de modo algum uma pretensão de “orientalizar” os novos membros da Igreja; posto que, seguramente, com o passar dos anos, haverá quem seja capaz de formular consensualmente e num âmbito idôneo, uma melhor adaptação litúrgica às formas regionais, que possam dar ao rito a característica local que todo rito bizantino possui.

Cabe destacar que os ritos, se bem que tenham uma origem histórico-geográfica concreta, superam as limitações de tal marco, detendo, com o passar dos séculos, essa nota de catolicidade que é característica da Igreja de Cristo. É por esta razão que, associar ou encapsular o rito bizantino num marco cultural e étnico oriental, é privar-lhe de maneira imperdoável de sua vocação católica.

O fato de pretender dotar os convertidos de uma bagagem cultural oriental é tão absurdo, -e, de certo modo, tão contraproducente,- como se, por exemplo, as numerosas missões evangélicas que abundam na América do Sul quisessem impor a seus seguidores a celebração de suas reuniões em língua alemã do século XVI, com a justificativa de que foi em tal língua que escreveu Martinho Lutero, ou porque a Reforma teve origem nos principados alemães. Não obstante, nenhum evangélico, por mais limitado teologicamente que seja, desconhece os fundamentos básicos de sua fé, nem, por exemplo, desconhece a preeminência que dão eles à fé sobre as obras, ainda que, certamente, muitos evangélicos, em sua simplicidade, desconhecem que foi Lutero que propugnou tal doutrina.

Precisamente, a importância dos Santos Padres reside no fato de que tenham traduzido a doutrina cristã, concebida num ambiente espiritual e cultural judeu, à cultura e idiossincrasia helênica e latina que imperava no mundo mediterrâneo da época, tornando compreensível para os não-hebreus a História da Salvação. Já o apóstolo Paulo tinha uma clara visão sobre a inculturação da mensagem do Evangelho. É por esta razão que, a critérios atuais, seria absurdo que nós, cristãos ortodoxos, não imitássemos nossos antigos mestres, negando-nos a transvasar nossa bagagem teológico-espiritual ao mundo ocidental e, em particular, latino-americano.

Certamente que a Fé Ortodoxa desenvolvida na América Latina terá, com o passar do tempo, características muito próprias, e não me refiro tanto ao aspecto litúrgico, mas também à forma de vivenciar a Fé Cristã neste rincão do mundo. É provável que a ortodoxia na América Latina tenha uma maior sensibilidade para temas sociais, que tanto urgem por aqui, assim como, quem sabe, tenha uma menor tendência ao apego por tradições étnicas e uma maior tendência à unidade das igrejas locais, posto que, o ideal de um sub-continente unido faz parte do ideal coletivo de nossas sociedades. É comum ver, em foros de discussão, como os ortodoxos latino-americanos – sejam de que jurisdição forem - revelam uma tendência de precaveren-se com maior facilidade que outros de diferentes etnias, e isto, quem sabe, se deva também a uma bagagem religiosa e cultural de semblante católico do qual estão imbuídos nossos povos, para quem a unidade da Igreja é um dom muito precioso.

É necessário ainda destacar que os ortodoxos latino-americanos não deverão ceder à tentação de simples conformação ao que lhe seja artificialmente oriental, pela simples razão de que, ser cristão não implica necessariamente ser oriental.

Quiçá, a maior responsabilidade dos latino-americanos convertidos à Fé Ortodoxa seja a de aportar precisamente sua latinidade ao concerto de vozes da Igreja e, por esta mesma razão, seria um lamentável erro considerar que um latino deva adaptar-se passivamente às formas étnico-culturais já existentes no seio das igrejas ortodoxas helênicas ou eslavas. Da generosidade evangélica das Igrejas-mães e da responsabilidade valente dos ortodoxos latino-americanos dependerá, em grande medida, os bom êxito neste importante desafio pastoral.

Fonte:

Pró-Ortodoxia

 

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